É cediço que desde o ano de 1992 todos os agentes públicos que praticarem condutas que acarretarem em atos de improbidade administrativa, bem como os particulares que induzirem ou concorrerem para a confecção dos referidos atos, serão processados e julgados conforme a Lei Federal nº 8.429.
O agir de forma ímproba é uma condição que permeia o Brasil, bem como o mundo, desde há muito tempo, mais precisamente desde à formação da sociedade civil organizada sobre a forma de Estado. Entretanto, no Brasil a referida transgressão só foi elevada à importância constitucional no ano de 1988, com o advento da Constituição da República Federativa do Brasil.
Nesse sentido, até o ano de 2019 aqueles que eram processados em ações de improbidade administrativa, quando não eram absolvidos por suas condutas, tinham como destino certo uma sentença condenatória que aplicaria severas e duras sanções.
Um grande debate que sempre houve acerca da Lei n. 8.429/1992, é acerca da desproporcionalidade das penas fixadas aos atos cometidos, em tese considerados como ímprobos, notadamente quando são realizados sem a configuração de má-fé, em especial no caso de gestores públicos.
Além disso, uma das mais duras críticas é a de que nunca houve a possibilidade de se realizar acordos judiciais e composições com o Ministério Público e Judiciário, sob o crivo da Lei n. 8.429/1992, que previa expressamente tal vedação.
Aliás, quanto a isso, sempre houve o argumento contrário a tal disposição, sob a justificativa de que até mesmo em matéria penal, com o cometimento de um crime, o réu poderia realizar acordos judiciais, como disciplina a Lei n. 9.099/95. Como também ocorre com o Novo Código de Processo Civil de 2015, cuja tendência é a busca de soluções consensuais para resolução dos conflitos.
Visando dirimir tais questões, o Ministério Público buscou realizar resoluções consensuais no âmbito extrajudicial, com a celebração de Termos de Ajustamento de Condutas, que se não cumpridos, ensejariam a denúncia por Improbidade Administrativa. Porém, tais medidas não são suficientes para a gravidade da questão.
Nesse interim, buscando flexibilizar a rigidez legislativa insculpida na Lei n. 8.429/92, é que a Lei n. 13.964/2019 – intitulada de Pacote Anticrime – fez alterações profundas na Lei de Improbidade Administrativa.
Com sua promulgação, alterou-se a redação original do art. 17, da Lei n. 8.429/1993, para fazer constar, expressamente, no seu §1º a permissão para realização de acordos de não persecução cível nas ações de improbidade, nos termos da lei.
Tal alteração legislativa foi um importante passo para o Instituto da Improbidade Administrativa, ao passo que até o ano de 2019 havia uma enorme discussão acerca da possibilidade de celebração de acordo nas referidas ações, sendo o posicionamento majoritário da jurisprudência contrário as soluções consensuais.
Entretanto, mesmo tendo conseguido um grande avanço para o debate, o Pacote Anticrime deixou conceitos vagos em seus termos estabelecidos, uma vez que não definiu e esclareceu o que vem a ser “acordo de não persecução cível”, quais pontos estão sujeitos ao acordo, bem como quais seriam os legitimados para propô-lo.
Simplesmente se comprometeu a afirmar que as regulações de tais soluções consensuais serão realizadas nos termos da lei, a qual não prevê qualquer tipo de solução consensual, ou sua regulamentação, que não o art. 17, §1º.
Diversas são as vias adotadas para a utilização deste dispositivo, como bem fez o Ministério Público Federal no Estado de Pernambuco, ao editar a Resolução nº 01/20, de 10/02/2020, que regulamenta a celebração de acordo de não persecução cível no âmbito da improbidade administrativa. Porém, tal ato não possui o condão de estabelecer uma diretriz nacional e firmar uma maior segurança jurídica.
Dessa forma, embora esteja prevista a novidade de soluções consensuais na Lei n. 8.429/92, vê-se que tal instrumento de resolução de litígio encontra-se pendente de regulamentação legal, o que pode acarretar, por um longo período, sua ineficácia.
JOÃO VITOR COMIRAN – Trainee Jurídico