A validade da demissão durante a pandemia

Sumário

Em razão da pandemia vivenciada em todo o mundo, e a crise econômica oriunda da decretação do estado de calamidade pública e, consequentemente, da paralisação de atividades empresariais, o Governo Federal lançou alguns programas emergenciais na tentativa de conter os impactos causados pela pandemia da Covid-10 no âmbito das relações de trabalho, preservando o emprego e a manutenção das atividades empresariais do País.

O objetivo principal do Governo era preservar o emprego e a renda, garantir a continuidade das atividades empresariais e a manutenção da renda do trabalhador e reduzir o impacto social diante da paralisação de atividades e restrição de mobilidade em todo o País. Em razão disso, muitos acreditaram que estariam com seus empregos assegurados.

Todavia, os impactos causados pela pandemia foram maiores do que o esperado, e muitas empresas precisaram reduzir a mão de obra para garantir a continuidade da atividade empresarial. Em consequência disso, aqueles empregados que discordaram da demissão em razão dos diversos programas lançados pelo Governo, ingressaram com ações trabalhistas requerendo a reversão da demissão e reintegração ao emprego.

Em sede de julgamento de um recurso no processo de Correição Parcial 1000086-94.2021.5.00.0000, o Órgão Especial do Tribunal Superior do Trabalho rejeitou o recurso de um bancário do Banco Bradesco S.A. no Rio de Janeiro (RJ) que pedia para ser reintegrado por ter sido demitido durante a pandemia da covid-19. Segundo ele, o banco havia descumprido o compromisso que previa a manutenção de empregos durante a pandemia, pois havia assumido o compromisso público de manter os vínculos contratuais durante a pandemia, ao aderir ao movimento #nãodemita. O movimento foi lançado no início de abril de 2020 e chegou a engajar milhares de empresas que se comprometeram a não reduzir seus quadros em razão da crise.

Esse compromisso, segundo o bancário, deveria perdurar durante o estado de calamidade pública, prorrogado pelo governo do Estado do Rio de Janeiro até 1º/7/2021. Paralelamente à reclamação trabalhista, o bancário impetrou mandado de segurança visando à reintegração, que foi deferida pelo juízo de primeiro grau.

Contra a antecipação de tutela, o Bradesco impetrou mandado de segurança, mas a ordem foi mantida. O banco, então, propôs Correição Parcial no TST, argumentando que a reintegração fora avalizada pelo juízo de primeiro grau apenas com base no entendimento de que a situação pandêmica impediria o exercício do direito potestativo do empregador de demitir. Segundo o Bradesco, seu compromisso público era o de não demitir por 60 dias, e este prazo fora respeitado, e por unanimidade, o colegiado entendeu que não há suporte jurídico para a ordem de reintegração.

O corregedor-geral explicou que a Lei 14.020/2020 definiu as situações excepcionais de estabilidade no emprego durante a pandemia, limitando-as ao empregado que receber o benefício emergencial de preservação do emprego e da renda, decorrente da redução da jornada de trabalho e do salário ou da suspensão temporária do contrato de trabalho, e ao empregado com deficiência. E que, “Excetuadas essas hipóteses e as demais atinentes a garantias gerais de emprego que não encontram causalidade nas mazelas da pandemia da covid-19, não há respaldo no ordenamento jurídico para se restringir a decisão quanto à dispensa imotivada”, afirmou.

Dessa forma, na visão do Corregedor, o compromisso público de não demissão tem caráter meramente social, considerando-se uma “carta de boas intenções”, sem conteúdo normativo que ampare a tese da estabilidade no emprego, e em caso de eventual descumprimento, enseja reprovação tão somente no campo moral, sem qualquer repercussão no âmbito jurídica.

No entendimento do Ministro Aloysio Corrêa da Veiga, corregedor-geral da Justiça do Trabalho, relator do caso, falta clareza quanto ao suporte jurídico da ordem de reintegração, pois não existe fundamentação quanto à hipótese de garantia de emprego que ampara a medida. Segundo o Ministro, a dispensa constitui direito potestativo do empregador, decorrente do poder de direção, “excetuadas as hipóteses legais que trazem previsão restritiva do exercício de tal direito”, explicou.

Advogada Kamila Lemos
OAB/MS 22.441

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